«Estado português prestes a cortar relação com antigo símbolo do império
O cordão umbilical do Estado português com a barragem moçambicana de Cahora Bassa começa a ser cortado na segunda-feira, com a venda da participação que ainda mantém no empreendimento, assinalando o fim da relação com um símbolo do império colonial.
Corria o ano de 1956 quando técnicos da Hidroelétrica Portuguesa visitaram pela primeira vez os rápidos de Cahora Bassa, no rio Zambeze, um dos maiores do mundo.
Lá chegados, estes primeiros exploradores registaram o potencial para se produzir energia elétrica. Porém, só dez anos depois, a Hidroelétrica Portuguesa seria contratada para elaborar o projeto de aproveitamento daquela que viria a ser a maior barragem construída por Portugal e um símbolo da pujança do império colonial, em resposta às críticas da comunidade internacional face ao atraso socioeconómico de Moçambique.
O nome Cahora Bassa significa, na língua local, o “trabalho acabou” – era a partir daquele lugar que o rio deixava de ser navegável, explicação que já consta nos documentos do português Gago Coutinho, que, no início do século XX, terá sido dos primeiros a chegar onde supostamente ainda nenhum outro europeu estivera antes.
Situada a poucos quilómetros da vila do Songo, no distrito de Tete, Cahora Bassa começou a ser construída em 1969, com a adjudicação da obra ao consórcio ZAMCO.
Em plena guerra colonial, o mais colossal empreendimento deixado por Portugal em todo o império não deixou de ser visto como instrumento de uma estratégia para impedir a progressão da guerrilha moçambicana para o sul do rio Zambeze.
A barragem foi alvo de ataques e boicotes da resistência moçambicana, mas o perímetro militar em redor do estaleiro de construção impediu maiores danos.
A prioridade da hidroelétrica era fornecer energia a baixos custos à África do Sul, no contexto de um acordo de exclusividade assinado entre Pretória e Lisboa, em 1969, contestado pelos moçambicanos. Atualmente, após sucessivas revisões do contrato para abrir o fornecimento de energia a outros países (Zimbabué, por exemplo), a África do Sul continua a ser o principal consumidor da energia da barragem.
Com o fim da ditadura em Portugal e a independência de Moçambique, foi criada a Hidroelétrica de Cahora Bassa, após um protocolo entre o Estado português e a Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), dois dias antes da proclamação da independência da República Popular de Moçambique, declarada a 25 de junho de 1975.
A barragem acompanhou o caminho dos dois países em direção à democracia desde os primeiros passos, mas Portugal continuou a deter uma participação maioritária durante mais três décadas.
A 29 de março de 2004, Portugal e Moçambique anunciaram o acordo para se encontrar uma solução definitiva para a Hidroelétrica de Cahora Bassa, em que se passasse a maioria do capital para o Estado moçambicano.
As negociações prosseguiram durante três anos. O acordo de reestruturação e transmissão da hidroelétrica foi assinado a 31 de outubro de 2006, mas só um ano depois o governo moçambicano garantiu a Portugal estarem "reunidas as condições" para saldar a dívida de cerca de 530 milhões de euros pela reversão da barragem.
A 27 de novembro de 2007, Moçambique passou a deter 85 por cento do capital e a controlar pela primeira vez o conselho de administração.
O acordo de reversão da barragem foi assinado entre o primeiro-ministro português, José Sócrates, e o presidente da República de Moçambique, Armando Guebuza.
Na megacerimónia que assinalou a mudança, na qual participaram governantes de Portugal, Zimbabué, Zâmbia, Botsuana, África do Sul e Suazilândia, Guebuza colocou na boca do povo o grito “Cahora Bassa é nossa!”, numa alusão à frase dita pelo primeiro Presidente de Moçambique independente, Samora Machel, irritado com o contrato de fornecimento em exclusivo para a África do Sul, sob o regime segregacionista do apartheid – "Cahora Bassa não é nossa".
“Foram 32 anos de avanços e reveses. Foram 32 anos de esperança e frustração”, assinalou Guebuza, no discurso oficial de 2007.
Portugal manteve 15 por cento do capital, mas sob o compromisso de vender cinco por cento quando Maputo solicitasse, em condições de mercado aceitáveis e mediante uma prévia avaliação, e os restantes dez por cento nos termos em que entendesse.
O atual primeiro-ministro português, Pedro Passos Coelho, começará a virar a página na visita oficial de dois dias a Moçambique que inicia na segunda-feira, com a transferência prevista de 7,5 por cento dos 15 por cento que Portugal ainda detém. A transmissão dos outros 7,5 por cento deverá efetivar-se no prazo máximo de dois anos.
Agência Lusa» in http://noticias.sapo.pt/economia/artigo/estado-portugues-prestes-a-corta_3234.html
(Construção da Barragem de Cahora Bassa - Part.1)
(Barragem de Cahora-Bassa - A Entrega - TVI - 27-11-2007)
(MOÇAMBIQUE/1964-1974 2ª PARTE)
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