30/12/12

Poesia - O Poeta Fernando Pessoa em mais um soneto brilhante, como só ele sabia escrever, na lucidez da sua complexidade enquanto ser humano!



DEIXEI de ser aquele que esperava...
Isto é, deixei de ser quem nunca fui.
Entre onda e onda a onda não se cava, 
E tudo, em seu conjunto, dura e flui.

A seta dorme, inerme, na ampa aljava.
O presente ao futuro cria e imbui.
Se os mares erguem sua fúria brava
É que a futura paz seu ritmo obstrui.

Tudo depende do que não existe.
Por isso meu ser mudo se converte
Na própria semelhança austera e triste.

Nada me explica. Nada me pertence.
E sobre tudo a lua alheia verte
A luz que tudo usurpa e nada vence.

Fernando Pessoa in Poesia (1931-1935)

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