18/02/09

Arte Poesia - Poema "Projeto de Sucessão!" de Ângelo Ochôa!


"Projecto de Sucessão!"


«'Projecto de sucessão…'


Continuar de pé até que pombas dos meus olhos voem.
Continuar dormindo até se regelarem os dedos.
Continuar rezando até que o tempo finde.
Continuar esperando que o café feche.
Continuar despido até que o colchão navegue.
Continuar escrevendo até que o papel acabe.
Continuar apaixonado até que o mundo acorde.
Continuar sonhando até que morto durma.
Continuar delirando até se incendiarem órbitas.
Continuar ladainhas até que o cérebro estale.
Continuar a acompanhar o derrube dos tiranos.
Continuar iluminado até que a maluqueira pare.
Continuar chorando por um miosótis encarnado.
Continuar a ateimar no trevo das quatro folhas.
Continuar a seguir a rota da estrela cadente.
Continuar a guardar no coração cintilações natalícias.
Continuar a procurar um piolho estrelinha
na cabeça rachada do Menino Jesus.
Continuar a arriscar vermelho branco.
Continuar sangrando até se esgotar a água.
Continuar boiando até que o sangue estanque.
Continuar a coçar minha jubilosa ferida.
Continuar a prolongar o gélido chuveiro.
Continuar a adorar a mulher artimanha.
Continuar a andar sobre escombros lua.
Continuar sentado até os pés da cadeira enraizarem.
Continuar a dar corda a relógios que ninguém olha.
Continuar auscultando especial música.
Continuar a elucubrar invariáveis linguagens.
Continuar a cantarolar o milagre da vida.
Isto e muito mais até que o paizinho evapore.
Isto e muito mais até que a paz floresça.»

Ângelo Ôchoa, Poeta.


2 comentários:

  1. Ao Hélder Barros, no dia em que publicou, em seu blogue, este vide de poema meu, e tentando uma achega para fazer um poucochinho de uma ociosa história do surrealismo em Portugal:

    António Maria Lisboa

    PROJECTO DE SUCESSÃO

    Para o Mário Henrique

    Continuar aos saltos até ultrapassar a Lua
    continuar deitado até se destruir a cama
    permanecer de pé até a polícia vir
    permanecer sentado até que o pai morra

    Arrancar os cabelos e não morrer numa rua solitária
    amar continuamente a posição vertical
    e continuamente fazer ângulos rectos

    Gritar da janela até que a vizinha ponha as mamas de fora
    pôr-se nu em casa até a escultora dar o sexo
    fazer gestos no café até espantar a clientela
    pregar sustos nas esquinas até que uma velhinha caia
    contar histórias obscenas uma noite em família
    narrar um crime perfeito a um adolescente loiro
    beber um copo de leite e misturar-lhe nitro-glicerina
    deixar fumar um cigarro só até meio

    Abrirem-se covas e esquecerem-se os dias
    beber-se por um copo de oiro e sonharem-se Índias.

    Ossóptico,
    1952

    (…Este o poema
    ‘projecto de sucessão’
    escrito por António Maria Lisboa
    e publicado em 1952
    quando eu ainda tinha linda idade de 8 aninhos
    e que pretextou o meu ‘projecto de sucessão’
    agora aqui neste espaço cibernético do Helder Barros…)

    …Aqui fica a que
    os frequentadores e
    as frequentadoras do
    informaticahbblogue
    leiam
    ou
    releiam
    e
    de si e
    por si
    concluam…

    Com o abraço de sempre do Ochoa
    -- para o Helder um verdadeiro amigo meu e amigo do belo do mundo criado.

    ResponderEliminar
  2. Obrigado Amigo Poeta Ângelo Ôchoa por nos dar Cultura, Poesia, em tempos de grande imoralidade e Medíocridade, reinantes neste nosso Mundo!
    Ao Menos os Poetas falam à Alma, dão mais vida ao nosso ser; não vendem ilusões em forma de realidade negra!
    Bem haja Poeta!

    ResponderEliminar