
A Ana Bastos chama a atenção para o artigo do Hicham Yezza no Guardian, intitulado “Student apathy is good for business”. E vale, realmente, a pena lê-lo na íntegra.O que é descrito por Yezza não reflecte mais do que a minha profunda desilusão para com o ensino superior, como estudante tardio que sou.
Seria fácil para mim, com os meus 44 anos de peso, pensar que a apatia generalizada que se vive nas escolas fosse produto da idade dos estudantes e da
mudança de valores a que actualmente assistimos. Pensar que tal se constituísse uma forma de protesto silencioso, uma espécie de abstencionismo ideológico militante, fruto das políticas que nos têm vindo a governar e que, mais do que todo o resto, produzem um gritante “no future” que, mais que nos tempos “punk”, tem agora toda a razão de ser, seria legítimo. Afinal, esse é o legado de uma geração de inadaptados, prisioneiros de ideologias que não singraram, prisioneiros do erro consecutivo das utopias marxista e capitalista.Mas, se tal é legítimo pensar, não chega ainda assim para caracterizar as razões que transformam a massa juvenil, e toda a sua força, num irreal rebanho.

O facto é que, após os termos entregue à convivência autista com os jogos
portáteis e com a Internet, porque tal sai, afinal de contas, barato, enquanto nos preocupamos em consolidar carreira ou a ganhar os tostões que pagam as contas e o cartão de crédito, estes jovens foram crescendo entregues aos cuidados externos de um sistema educativo que, pretendendo fazê-los úteis a todo o custo, os transforma em algo parecido com os “yuppies” dos anos oitenta, se bem que o objectivo seja, agora em vez de ficar rico, arranjar um emprego e, de preferência, mantê-lo.Assim, em nome da empregabilidade e do futuro incerto, as instituições de ensino estão transformadas em enormes workshops que, durante
semestres a fio, os preparam para o culminar de todo um processo educativo, a entrevista para emprego. Gerar conhecimento ou empregar o conhecimento adquirido é visto como um pormenor, interessa arranjar trabalho.É por isso que interessa um tipo de política do género “no child left behind”, como a que se tem hoje em Portugal, no ensino secundário. Assim teremos profissionais operacionais, impedidos que ficam de obterem um currículo académico mais avançado, pelo deficiente grau de conhecimentos adquiridos e necessários para entrar no ensino superior. Como diria alguém que conheço, “também, nem todos podemos ser doutores”.De seguida, reserva-se aos estudantes superiores uma aprendizagem rica em pormenores insignificantes e cujos objectivos não são ainda claros: se, por um lado, considero que não deve ser objectivo principal do ensino superior a profissionalização, por outro, também não vejo acontecer o objectivo que creio ser o correcto, o da criação de conhecimento.Antes pelo contrário.




C.J.T.” In http://fractura.net/
25/02/2009»
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Carlos J. Teixeira, no seu artigo, tem um duplo mérito: o de traçar o diagnóstico da educação e do ensino em Portugal e, simultaneamente, o de levantar questões muito pertinentes.
ResponderEliminarEis o que me parece digno de reflexão:
1. As escolas já são - por antecipação e desejo do presidente da Confap - "depositários" humanos.
2. Os conteúdos programáticos encontram-se, demasiadas vezes, desajustados relativamente às finalidades mais elevadas da Educação: a conquista/construção do conhecimento, da qual decorre, inevitavelmente, a autonomia, isto é, o desenvolvimento das capacidades de análise, de problematização e crítica.
3. Os professores/educadores podem e devem assumir-se como paradigmas da mudança, do inconformismo cerebral e profissional, como motores da evolução ou formação dos seus discentes.
Durkheim afirmou que "Educar é condicionar". A assimilação/reprodução de valores que a escola, enquanto micro-sociedade, almeja com o intuito de se auto-perpetuar, parece dar-lhe razão.
Não nos podemos demitir, enquanto professores-educadores, de estilhaçar as fronteiras mentais, os esquemas cerebrais rigídos, os preconceitos...Só assim proporcionaremos aos jovens a aprendizagem e o exercício mais significativo porque o mais duradouro: o do pensamento esclarecido e o da acção interventiva.
Finalmente, quero registar algumas questões:
A apatia dos estudantes poderá decorrer da apatia de quem ensina? de quem educa (em casa)? de quem governa? de todos, inclusivé de si próprios???
Concordo em pleno com a tua apreciação do texto, brilhante como sempre!
ResponderEliminarAdmito que gostei da adjectivação: "estado de bovinidade..."
Paletes de malta neste estado...
Também adorei a expressão!
ResponderEliminarAmanhã perscrutaremos o "estado de bovinidade"...
grato pela reprodução!
ResponderEliminarabraço.
De nada!
ResponderEliminarEu é que tenho que agradecer a qualidade da sua reflexão que, verdadeiramente, me interpelou!
Muita gente hoje comentou comigo a qualidade da sua reflexão!
Excelente artigo, bem haja!
Ao dispor,
Helder Barros