18/10/21

Ambiente e Ecologia - No norte do Chile existe um arquipélago intocado, refúgio de pinguins e lontras ameaçados, que, segundo ativistas climáticos e cientistas está em risco devido à construção do projeto mineiro e portuário Dominga no deserto do Atacama.


«PARA ONDE IRÃO OS PINGUINS? ARQUIPÉLAGO INTOCADO NO CHILE EM RISCO DEVIDO A PROJETO DE MINERAÇÃO

No norte do Chile existe um arquipélago intocado, refúgio de pinguins e lontras ameaçados, que, segundo ativistas climáticos e cientistas está em risco devido à construção do projeto mineiro e portuário Dominga no deserto do Atacama.

Localizado a cerca de 530 quilómetros a norte de Santiago e ao largo da costa do município de La Higuera, o arquipélago de Humboldt abriga 80% da população mundial de pinguins de Humboldt - em perigo de extinção - nas suas oito ilhas. Três dessas ilhas estão protegidas como reserva nacional.

Humboldt é também lar de chungungos - a menor lontra do mundo e também em perigo de extinção - e de centenas de leões-marinhos e golfinhos nariz-de-garrafa, que nadam entre algas e cardumes de peixes.

As águas atraem milhares de aves, que repentinamente voam quando enormes baleias - até 14 espécies - sobem à superfície das profundezas do Pacífico para respirar.

AMEAÇA A UM "TESOURO NATURAL"

O arquipélago é um "tesouro natural" e de biodiversidade, diz o académico Carlos Gaymer, da Universidade Católica do Norte, à AFP.

"Cientistas de todo o mundo reconheceram que não há lugar igual a este no planeta", acrescenta.

Por este motivo, cientistas, ativistas e moradores do litoral rejeitam o projeto de mineração Dominga, na região de Coquimbo.

Com um investimento bilionário, o projeto pretende explorar, a céu aberto, uma jazida de ferro e cobre, destaca a proprietária Andes Iron, no site.

Nesta zona desértica, perto do povoado de La Higuera, uma estação de tratamento e tanques também serão construídos. O projeto inclui ainda a construção de uma central de dessalinização e um porto de carga de minerais em Totoralillo, a cerca de 26 quilómetros a oeste da jazida e a 30 quilómetros do arquipélago.

"CRIME AMBIENTAL"

Para Gaymer, o projeto Dominga é como instalar um porto mineiro nas Ilhas Galápagos, no Equador, e para Matías Asun, diretor do Greenpeace Chile, é um "verdadeiro crime ambiental".

"Fazer um projeto de mineração lá, mesmo o melhor projeto de mineração que se possa fazer, é o equivalente a colocar uma discoteca numa maternidade", compara Asun.

Os pescadores artesanais da localidade de Punta de Choros, que acordam todos os dias com a vista das ilhas de onde se encontram, na costa, coordenam as áreas de gestão sustentável ou de pesca há gerações.

"Talvez a riqueza que possuímos não seja material, mas está no nosso arquipélago, em navegar livremente pelas nossas ilhas", defende Elías Barrera, de 26 anos, terceira geração de pescadores e mergulhadores coletores.

Para nós, a mineira Dominga é a destruição da nossa cultura ancestral do povo Chango, que predomina há mais de 10.000 anos nestes territórios, vivendo de forma íntegra e sustentável com o meio ambiente", completa.

Nos arredores, vivem guanacos, raposas do deserto e colónias de papagaios Tricahue - coloridos, grandes e em perigo de extinção -, que gritam sem parar ao entardecer nos seus ninhos construídos em paredes de areia.

A empresa recusou os pedidos da AFP para comentar o projeto.

"TRABALHO PARA TODOS"

A empresa planeia  uma exploração de 22 anos, com uma produção anual de 12 milhões de toneladas de ferro e 150.000 toneladas de cobre. O Chile é o maior produtor e exportador mundial desta commodity.

A Andes Iron promete criar 10.000 empregos diretos e 25.000 indiretos na fase de construção, e 1.500 diretos e 4.000 indiretos, durante as operações.

O Tribunal Ambiental de Coquimbo avaliou o projeto de forma favorável em agosto. Ainda há, no entanto, recursos pendentes na Suprema Corte do país devido ao impacto ambiental.

É uma tremenda oportunidade para La Higuera, para além dos impactos que pode causar no meio ambiente, porque todo o projeto gera impacto", defendeu o governador Yerko Galleguillos, em entrevista à AFP.

O argumento repete-se nesta cidade de 3.892 habitantes. Sem água potável, rede de esgoto, ou supermercado, os moradores acreditam que o projeto trará prosperidade a uma área desamparada no meio do deserto.

"Aqui há muita gente que sai à procura de trabalho, que deixa as suas famílias. Se a mineradora Dominga istalar-se aqui, vai gerar emprego para todos", afirma Johanna Yvonne Villalobos, uma dona de casa de 47 anos.

A bióloga Cristina Dorador, que integra a Convenção Constitucional, ressalta, no entanto, que é preciso mudar o atual modelo de desenvolvimento do Chile, baseado na exploração da matéria-prima às custas da natureza.

"Claramente vamos ter de desenvolver alternativas [...] para que o Chile se transforme numa sociedade do conhecimento e não tenha de depender, finalmente, dos mercados externos e da procura por minerais, como é o caso atualmente", disse a bióloga à AFP.

O projeto também é polémico, porque já está marcado por suspeitas de corrupção.

A oposição chilena acaba de pedir ao Congresso o impeachment do presidente Sebastián Piñera - que também está a ser investigado pelo Ministério Público. Uma empresa dos filhos vendeu Dominga em 2010 para um dos seus melhores amigos num paraíso fiscal, uma operação revelada nos "Pandora Papers".

No contrato de venda, a última parcela do pagamento estava condicionada a "que não se estabelecesse uma área de proteção ambiental sobre a zona de operações da mineradora, como exigem grupos ambientalistas". O pagamento foi feito, porque, até o momento, a área continua desprotegida.» in https://viagens.sapo.pt/viajar/noticias-viajar/artigos/para-onde-irao-os-pinguins-arquipelago-intocado-no-chile-em-risco-devido-a-projeto-de-mineracao

(Archipiélago Humboldt, paraíso en peligro)

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