«A FONTE DAS VIRTUDES
alameda
Quem hoje passeia pelo Passeio das Virtudes e olha por aquele gradeamento, não imaginará como seria o primitivo local. Entre as muitas colinas e montes que o Porto apresenta, hoje muito gastas pelos sucessivos anos de ordenamento, pelas construções e pela modelação das elevações, corriam rios e ribeiros a céu aberto definindo, por vezes, profundas gargantas rodeadas de penhascos.
Pois por esta garganta que agora vemos, corria um impetuoso rio vindo de um ponto elevado, onde hoje se localiza o Hospital de Santo António.
Mas que rio seria esse que ali corria e que hoje se não vê?
Pois não vê, mas lá continua a correr.
Em todo o caso, falar das Virtudes é falar desse rio, o Rio Frio, que nasce para as bandas da Torrinha e que no seu percurso, recebe outros cursos de água, passa por baixo do Hospital de Santo António e que vinha despenhar-se no meio de fraguedos constituindo uma profunda garganta, até desaguar em Miragaia, no local onde hoje se encontra a Alfândega.
O nome Frio estará ligado à infinita sabedoria popular que assim classificava a temperatura das suas águas.
Pois este rio Frio alimentava uma das mais belas fontes da cidade, a Fonte das Virtudes (por isso mesmo também conhecida por Fonte do Rio Frio) e que é Monumento Nacional desde 1938.
fonte virtudes
Também é à infinita sabedoria popular que se deve o nome de Virtudes.
No tempo em que foi construída, decorria o ano de 1619, a água que aqui chegava era límpida e cristalina e, no dizer do nosso povo, tinha muitas virtudes porque curava muitas maleitas.
Ao lado, embora situados a um nível inferior, ficavam uns lavadouros de pedra que recebiam a água da fonte. E a água que da fonte escorria continuava a descer, enchendo outros tanques e irrigando os campos, até abraçar o rio Douro.
Ao local aprazível associava-se o sussurrar da água que provocava nos presentes uma infinita sensação de calma. Foi por isto mesmo que a Câmara fez construir aquela profunda rua que desce da Alameda até à fonte e, próximo desta, pôs bancos de pedra e relvou o conjunto.
Para aqui se deslocava em domingos soalheiros a sociedade portuense, os dandys, as belas senhoras e as raparigas casadeiras, os homens de negócios, os poetas, os juízes e, claro está, as crianças. Toda aquela rua ficava, aos domingos de bom tempo, pejada de carroças que conduziam os seus ocupantes, para passar umas agradáveis e repousantes horas.
Mas o brilho da mais bela estrela também esmorece. Por volta de 1880, outros locais chamavam o portuense para desfrutar as delícias das paisagens e das conversas. E as Virtudes ficaram sós.
Firmino Pereira escrevia em 1912:
“As Virtudes, que viram passar as mais lindas mulheres do século XVII e XVIII, que foram o ponto de reunião dos peraltas e faceiras do velho burgo episcopal, que serviram de recreio a fidalgos, desembargadores e frades, é hoje o que era antes de ser convertido em jazigo dos judeus — um local abandonado onde se acoitam vadios e gatunos… Da fonte monumental, adornada de pirâmides, com as suas carrancas gigantescas, lavradas em pedra … pouco ou nada existe…”
Cem anos depois, pouco mudou relativamente ao que escreveu Firmino Pereira.
A fonte continua a ser uma sombra do seu passado.
A água já não corre, a belíssima imagem de Nossa Senhora das Virtudes, que ocupava o nicho central, já há muito desapareceu e a cartela central, qual flor aberta em tom avermelhado que cantava em latim a sua grandeza, está hoje vazia. As carrancas que durante centenas de anos cuspiram a fresca e límpida água estão hoje secas e os tanques já não existem; os bancos de pedra já de lá saíram e os graffitis vão-nos dizendo que ainda há muito a fazer pela sanidade social-urbana da população.
Diríamos que desta Obra de Arte, resta a sua pose artística que representa um marco na evolução da arquitetura. Conceptualmente é maneirista, definida pelas belas volutas desenhadas na pedra e pelas pirâmides que se apoiam nas bem desenhadas e equilibradas colunas. Este conceito marca a grande porta de entrada do estilo que fará do Porto um centro artístico mundial: o barroco.
NOTA: Caro leitor, todos estes textos estão protegidos por direitos de autor; nenhuma parte deste trabalho pode ser utilizada sem a nossa permissão expressa.» in https://marabo2012.wordpress.com/oquefazemos/porto-pontoencontro/cronicas/a-fonte-das-virtudes/
(O Porto do Germano: A mais famosa fonte da cidade)
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