Magnífico pedaço de prosa, bem camiliana, a descrever a importância dos caminhos importantes que cruzavam Amarante, acerca de como um inimigo do Marquês do Pombal se escondeu em local estratégico, na Estrada Pombalina, por ironia do destino:
«Acaso falávamos um dia nas estradas pitorescas, ladeadas de abismos alcantilados da província de Trás-os-Montes, e perguntou-me Valentim se eu conhecia os Padrões da Teixeira na estrada que vai de Amarante à Régua. Depois, escutando com a sua atenção muito enlevada de surdo, que era, as minhas reminiscências daquele espinhaço da serra do Marão, disse-me que seus pais e avós por ali tinham vivido e morrido em uma casa que está às cavaleiras do fraguedo nos espigões da montanha onde chamam Padrões da Teixeira. Eu sabia onde era. Está ali a poesia dos pavores supersticiosos. Resvalam umas umas escarpas crespas de rochas socavadas pelos córregos. Sobre essas barrocas dependuram-se penedias acasteladas que parecem ir rolando da espinha das cordilheiras. Os carvalhos hirtos, desfolhados e retorcidos que vegetam das figas do penhascal, reverdecem quando o ardor, do estio os desabrocha e queima com a mesma lufada de fogo. No Inverno a torrente do rio Teixeira, lá no côncavo fundo, referve, cachoa e estorce-se, como uma serpente em cujas escamas verde-escuras não rutila uma flecha de Sol. A corrente galga o penedio das margens, rugindo a espaços como trovoadas longínquas. Aquelas solidões são como um pedaço de globo em que se estão germinando num silêncio pavoroso criações monstruosas. Eu passara por ali uma vez em noite eléctrica de Agosto, quando as faíscas se cruzavam debaixo dos meus pés, na voragem, onde abriam cavernas luminosas, e os trovões pareciam o estampido daqueles morros que se despedaçavam uns de encontro aos outros. Lembro-me de ver então no topo da serra uma casa enormemente grande ao lampejo de um relâmpago que lhe dava projecções de sombras enormes. Era a casa dos avós de Valentim Mascarenhas.» in "Perfil do Marquês do Pombal" de Camilo Castelo Branco.
«Acaso falávamos um dia nas estradas pitorescas, ladeadas de abismos alcantilados da província de Trás-os-Montes, e perguntou-me Valentim se eu conhecia os Padrões da Teixeira na estrada que vai de Amarante à Régua. Depois, escutando com a sua atenção muito enlevada de surdo, que era, as minhas reminiscências daquele espinhaço da serra do Marão, disse-me que seus pais e avós por ali tinham vivido e morrido em uma casa que está às cavaleiras do fraguedo nos espigões da montanha onde chamam Padrões da Teixeira. Eu sabia onde era. Está ali a poesia dos pavores supersticiosos. Resvalam umas umas escarpas crespas de rochas socavadas pelos córregos. Sobre essas barrocas dependuram-se penedias acasteladas que parecem ir rolando da espinha das cordilheiras. Os carvalhos hirtos, desfolhados e retorcidos que vegetam das figas do penhascal, reverdecem quando o ardor, do estio os desabrocha e queima com a mesma lufada de fogo. No Inverno a torrente do rio Teixeira, lá no côncavo fundo, referve, cachoa e estorce-se, como uma serpente em cujas escamas verde-escuras não rutila uma flecha de Sol. A corrente galga o penedio das margens, rugindo a espaços como trovoadas longínquas. Aquelas solidões são como um pedaço de globo em que se estão germinando num silêncio pavoroso criações monstruosas. Eu passara por ali uma vez em noite eléctrica de Agosto, quando as faíscas se cruzavam debaixo dos meus pés, na voragem, onde abriam cavernas luminosas, e os trovões pareciam o estampido daqueles morros que se despedaçavam uns de encontro aos outros. Lembro-me de ver então no topo da serra uma casa enormemente grande ao lampejo de um relâmpago que lhe dava projecções de sombras enormes. Era a casa dos avós de Valentim Mascarenhas.» in "Perfil do Marquês do Pombal" de Camilo Castelo Branco.
Sem comentários:
Enviar um comentário