Hoje vou versar um pouco sobre uma importante figura da Literatura Amarantina e que passou os anos conturbados de mudança, da Monarquia para a República, sempre fiel aos seus ideais políticos, um republicano de corpo e alma. A consolidação da república foi um processo bastante agitado, com os avanços e recuos próprios das grandes revoluções.
Trata-se de Carlos Babo, meu familiar e que nasceu a 4 de Setembro de 1882, no lugar da Corredoura, freguesia de S. Tiago de Figueiró, Concelho de Amarante, onde viria a falecer a 2 de janeiro de 1958. Era primo direito do meu bisavô, igualmente de nome Carlos Babo e que viveu do Convento de Mancelos.
Aos 22 anos, incompletos, saiu da Universidade de Coimbra, formado em direito. Era vulgar entre os novos manifestarem-se republicanos durante o tempo de estudante e, mal chegavam ao fim da formatura, mostrarem-se logo acomodados às circunstâncias. O nosso biografado, porém, republicano de antes e depois, escapou-se conscientemente àquela transigência.
Enquanto colaborador na «Voz de Amarante» Carlos Babo deixava um nome e a afirmação dos princípios em que se tem mostrado sempre irredutível. Ademais, quando saiu da Universidade e foi direito tomar lugar na Comissão Municipal Republicana de Amarante, a par do Dr. António Cerqueira Coimbra, Alfredo Osório, José Pereira da Silva, Dr. Lago Cerqueira, Dr. Romão da Cruz, etc.
Aos esforços e cuidados deste intemerato partidário da República se deve em grande parte a constituição da 1.ª Comissão Municipal Republicana de Felgueiras. Durante o tempo em que esteve em Amarante escreveu um panfleto intitulado, Os mestres de Direito ou os Assizes da Universidade. Este trabalho foi editado em 1906, pela Livraria Moura Marques, de Coimbra, e é da propriedade, da Companhia Editora Portugal Brasil.
A este propósito escreveu o seu filho, Alexandre Babo, que felizmente ainda conheci em vida, uma figura muito afável e um humanista na senda dos princípios de vida que herdou do seu Pai, uma mente e um lutador inquieto, contra o conservadorismo doentio de certas instituições portuguesas. “Depois da formatura, esta pergunta medonha! Que hei-de fazer agora? Aprender a estudar, porque nem isso me ensinaram, pensar por mim e principiar aos 22 anos a luta que podia e devia ter sido travada há muito…” (Carlos Babo, “O Espírito da resistência”)
Se eu enquanto estudante me deparei com professores universitários, na faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, cujo processo de ensino passava essencialmente pelo decorar de sebentas e cujo prestigio se estribava, imagine-se, no reduzido número de passagens por disciplina, como não seriam estas figuras, no inicio do século XX?... daí que aconselho a leitura deste livro de Carlos Babo: Os mestres de Direito ou os Assizes da Universidade.
Depois desta experiência de formatura muito dolorosa e pouco formativa, Carlos Babo regressou a S. Tiago de Figueiró e advogou num escritório comum em Amarante, com o Grande Teixeira de Pascoaes, que se havia formado dois anos antes. Como se tratava de um Republicano convicto, Carlos Babo, não aguentou muito tempo num meio ainda muito conservador, incompatível com o seu espírito independente e rebelde, um republicano declarado, que escrevia em vários jornais locais e nacionais sem esconder o seu ideário político. O meio conservador e fechado que caraterizava a Amarante de então, Carlos Babo, carateriza de forma brilhante a experiência da sua confrontação com essa realidade, no Romance que publicou em 1922, de título “Amor Perfeito”, uma obra de reconhecida qualidade do escritor.
Um facto que lhe causou bastante amargura foi o corte de relações por motivos políticos com o Grande Escritor e Poeta Amarantino, Teixeira de Pascoaes. Carlos Babo abandonou Amarante com muito pesar de todos os seus amigos, se bem que tendo sofrido a animadversão das classes chamadas gradas, onde até havia correligionários seus – alguns republicanos transigentes ou timoratos – que fugiam dele para não caírem no desagrado dos monárquicos.
Carlos Babo foi pouco depois, investido nas funções de advogado do Diretório do velho partido republicano, do qual eram respetivamente presidente e secretário Bernardino Machado e António José d’Almeida. Daí para o futuro passou a consagrar-se àquelas funções, tendo renunciado à advocacia particular, por lhe ser impossível dispor de si, além dos serviços que a sua situação no Diretório lhe impunha, absorvendo-lhe este dever partidário toda a sua energia. Defendeu sempre com grande brilho e a maior solicitude todos os republicanos que os governos monárquicos acusavam de pertencerem às associações secretas.
O escritor Carlos Babo, proclamada a República, foi investido no cargo de secretário particular do Dr. António José D’Almeida, Ministro do Interior. Nesta situação se conservou até que a necessidade o forçou a aceitar a chefia duma repartição da Direcção Geral do Ensino Primário e Normal; e, quando foi criado o Ministério da Instrução, em 1913, transitou para este novo organismo.
Em poucas linhas é muito difícil descrever uma figura tão interessante e tão ativa nos campos, sociopolíticos e literários, que dignificou o nome de Amarante, na difícil transição política da Monarquia para a Republica e depois no complexo processo de consolidação desta.
Amarante dedicou-lhe o nome de uma rua, na zona da vinha, e, pouco mais tem feito para recordar este bravo republicano, cujo espólio foi doado à Câmara Municipal de Amarante.»
(Artigo a publicar na próxima edição de "O Jornal de Amarante")
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