19/12/22

Cidade do Porto - Violenta cheia de 1962, nas zonas ribeirinhas das cidades Porto e de Vila Nova de Gaia....



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Fonte:

https://gisaweb.cm-porto.pt/units-of-description/documents/308482/documents/


«A CHEIA DE 1962 

Quando se pensava que o caudal das águas do rio Douro estava, finalmente, controlado pelas barragens e que o aparecimento de uma cheia não seria mais possível, eis que o inesperado acontece: em janeiro de 1962, a cidade do Porto assiste a uma das maiores cheias de sempre. A quarta, em dimensão, entre as maiores de todos os tempos. Num primeiro lugar, nada honrosa, diga-se de passagem, está a cheia de 1739; logo a seguir figura a de 1909; em terceiro lugar a de 1779; e depois vem a de 1962 que atingiu, ao nível dos cais da Ribeira, Terreiro e Gaia, o nível impressionante de 4,5 metros de altura. 

O alerta de cheia começou a ser dado no Porto na manhã do dia 1 de janeiro daquele ano quando da Régua chegaram informações alarmantes: o nível da água havia subido ali a 12,80 metros. Como era normal acontecer em situações semelhantes, as autoridades portuenses ligadas às atividades marítimas e fluviais começaram de imediato a tomar as precauções que se impunham em casos como este: reforço das amarras de todos os barcos surtos no Douro e o abandono dos mesmos por parte das respetivas tripulações. Tudo correu conforme o previsto com exceção do capitão do navio espanhol Puerto Alicante, que se recusou a abandonar o seu posto mantendo -se, por isso, a bordo. 

Entretanto o nível da água ia subindo no Porto assustadoramente. Ainda pela manhã, a traineira Diamante, que se encontrava no estaleiro do Areinho, a montante da Ponte Maria Pia, desprendeu-se e começou de imediato a ser arrastada pela força das águas. Sem governo foi batendo em muitas das barcaças que ao longo do rio estavam amarradas aos cais, algumas carregadas com várias mercadorias. Com a força do embate partiam-se os cabos e as barcaças afundavam-se. Outras vogavam ao sabor da corrente e saíam barra fora. Num espaço de pouco mais de três horas, meia centena de barcaças haviam sido afundadas ou saído pela barra para o mar. 

Na sua descida desgovernada do rio a traineira foi direita ao sítio de Santo António do Vale da Piedade, no lado de Gaia, onde estava o iate português Teófilo contra o qual embateu e que, por sua vez, bateu noutro barco português, o Bata Novo, que se partiu em dois, afundando-se. Durante todo esse dia as autoridades marítimas reforçaram as amarras dos barcos que estavam no Douro. Na Alameda de Basílio Teles, em Massarelos, os cabos de reforço foram amarrados às árvores o que obrigou ao corte do trânsito naquela zona porque as amarras passavam por cima da faixa de rodagem. 

No dia 2, as notícias chegadas da Régua eram alarmantes. O nível da água, às 9 horas, havia subido para 17 metros; e à meia noite atingiu os 24 metros. Neste dia o capitão do Puerto Alicante, João Saragoza, de 31 anos, recebeu a visita do seu primeiro maquinista que inicialmente estava disposto a fazer companhia ao seu capitão. Porém, pouco depois de subir a bordo, pediu para o irem buscar. 

Foram dois trabalhadores do estaleiro do Ouro que, com risco da própria vida, o foram recolher num simples caíque. O capitão recusou-se a abandonar o seu barco. Ao anoitecer do dia 2 as autoridades marítimas solicitaram os serviços dos bombeiros a fim de que tentassem retirar o capitão do barco. O sistema mais viável era o do vaivém, mas os bombeiros tiveram sérias dificuldades em estabelecer esse serviço por causa da subida constante da água que impediu, por exemplo, a montagem da Calheta do foguetão, o aparelho que atiraria com um cabo para o navio de modo a possibilitar a montagem do vaivém. 

Durante este impasse o capitão tomou uma resolução: atirar-se à água e tentar alcançar terra a nado. Logo que isso aconteceu, um pequeno barco dirigiu-se ao local onde o marinheiro mergulhava mas não o encontrou. Mergulhou mas nunca mais foi visto. Melhor: quando o voltaram a ver estava morto. O cadáver apareceu, dias depois, na praia da Lagoa, em A Ver-o-Mar, na Póvoa de Varzim. 

Enquanto esta tragédia se desenrolava, uma multidão havia-se aglomerado nas duas margens do rio. Era tanta gente, e tão intenso o tráfego de veículos, que era quase impossível ir, mesmo a pé, da zona ribeirinha para o centro da cidade. A noite do dia 2 foi calamitosa.



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