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História - Os 70 anos do fim da segunda guerra mundial na Europa são assinalados na Praia de Angeiras, em Matosinhos, local onde a tripulação de um submarino alemão capitulou em 1945.



«U-1277: Memórias e histórias de um submarino
LUÍSA PINTO 10/05/2015 - 08:34

Os 70 anos do fim da segunda guerra mundial na Europa são assinalados na Praia de Angeiras, em Matosinhos, local onde a tripulação de um submarino alemão capitulou em 1945. Local vai ser o primeiro da costa portuguesa a ser documentado no projecto Baseline, uma iniciativa ambientalista de exploração, educação e protecção do património subaquático mundial.

8 de Maio de 1945: a guerra acabou. A Alemanha perdeu. Os membros da Marinha de Guerra do Reich recebem ordens para regressarem à base, em Kiel. 8 de Maio de 2015: Rui Spranger, actor, está de olhos perdidos e joelhos pousados no chão, enquanto atrás de si, na lota de Angeiras, em Matosinhos, são projectadas imagens da Segunda Guerra Mundial, da libertação dos judeus nos campos nazis, enquanto declama: “O erro de um soldado é a derrota. […] O erro de um soldado é a obediência”].

Rui Spranger fez um intervalo nas representações da peça “O Tesouro”, de Manuel António Pena, em cena no Teatro Pé de Vento, e está ali, momentaneamente vergado, e pensativo, para encarnar a personagem de um dos marinheiros da tripulação do U-1277, o submarino alemão cujo comandante recusou render-se aos russos, e levou os seus 46 marinheiros, Atlântico abaixo, durante um mês “de fome, de frio e de silêncio”, até chegarem ali, ao mar ao largo de Angeiras.

“Os soviéticos tomaram conta de Kiel. Entregarmo-nos aos russos era morte na certa. Argentina era muito longe. Vigo era a nossa melhor hipótese”, vai dizendo a personagem-marinheiro, avançando as razões que justificam que um submarino alemão do modelo U-Boat, uma das mais terríveis máquinas do poderoso exército alemão, esteja afundado “num sítio chamado Cabo do Mundo, ao norte do Porto” há precisamente 70 anos. 

Esta era apenas a quarta vez que o actor ensaiava o texto de Renzo Sicco, o fundador do Assemblea Teatro de Milão, e o autor do espectáculo que vai estrear no próximo dia 3 de Junho, ali mesmo, na praia de Angeiras, 70 anos depois do exacto momento em que o comandante Stever se entregou ao chefe do posto de guarda fiscal de Angeiras, Rudolfo Mesquita. “Os cinco últimos homens que abandonaram - e  afundaram o UBoat - estavam agora ali, a chegar a uma costa que desconheciam, sem saberem quem os ia recolher”, continuava Rui Spranger. 

Foi o chefe do posto da Guarda Fiscal de Angeira, Rudolfo Mesquita, quem aceitou a rendição do comandante alemão. “Ouvi esta história muitas vezes contada pelo meu pai. E conheço a história dos vizinhos que os acolheram e que lhes deram batatas e uma faneca”, diz, 70 anos depois, o neto e afilhado do guarda fiscal, também ele Rudolfo Mesquita e actualmente presidente da Junta de Freguesia de Lavra, agradavelmente surpreendido com a encenação a que acabava de assistir. 

“Sou um fiel militante do Teatro com Memória. Porque acredito que se formos buscar o passado e o trouxermos para o presente, podemos estar a preparar o futuro”, explica ao PÚBLICO Renzo Sicco, o autor e encenador. E há “muitas, tremendas, imensas” lições a tirar da história do U-1277, história essa que Sicco descobriu por acaso, quando se caminhava nos passadiços da praia de Lavra. “Esta é uma história extraordinária. Porque falamos sempre da perspectiva dos vencedores e esquecemos os vencidos e porque no mar, ganha a solidariedade, ao contrário da guerra, em que tudo são números - consultei os arquivos britânicos com a transcrição das comunicações entre os submarinos de guerra alemães, e é mesmo assim; chega um ponto que não são de pessoas que estão a falar, mas sim de números, de mortos, quantos mais melhor. No mar, pelo contrário, há o lema ‘salvamos primeiro, julgamos depois’. Foi o que aconteceu aqui, numa pequena praia perdida no Cabo do Mundo”, argumenta. Renzo não esconde que o facto de ser italiano, um país que se debate diariamente com os dramas no mar e os naufrágios de emigrantes que tentam chegar à Europa, o faz sentir que esta é uma das questões que importa reflectir, pensar, resolver no futuro. Agora, no presente, está apenas empenhado em devolver à comunidade piscatória de Angeiras a história do U1227. “Esta história é deles”, remata. 

Joaquim Pereira é outro desses pescadores, que ouviu falar da história do submarino desde pequenino. Nunca o viu, mas sabe onde está. “Digo muitas vezes à minha mulher: ‘Vou ao submarino’. Porque aquela zona ali é um viveiro de fanecas. É onde as vamos apanhar sempre”, relata. E imagina a profundidade pelas 18 braças que já usou de cordas para chegar ao fundo: “Ora, uma braça é pouco mais do que um metro. É fazer as contas. Deve estar afundado para aí a 30 metros”, vai dizendo o pescador, que actualmente é também o presidente da Associação de Armadores de Pesca de Angeiras. Pereira nunca viu o submarino. Também Pereira ficou muito agradado com a peça de teatro que os italianos da Assemblea Teatro e os portuenses do Teatro Pé de Vento lhes vieram trazer à porta.» in http://www.publico.pt/portugal/noticia/u1277-memorias-e-historias-de-um-submarino-1695097


(Wreck diving: U 1277)


(U-Boat 1277)


(U Boat 1277 06 09 2009)

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