«CRAQUES NO SAPATINHO
Cinco dos 55 jogadores que fazem parte do “Hall of Fame” do Museu FC Porto chegaram na quadra natalícia. Saiba quem são.
Por Fernando Rola/Museu FC Porto
O Natal dos portistas, de vez em quando, põe no sapatinho uma prenda especial: um craque daqueles que deixam marcas eternas. Cinco deles fazem parte do grupo de 55 que compõem o Hall of Fame, que tem um espaço especial no Museu FC Porto. Ali se podem recordar fotos, vídeos, os dados de cada um desses craques, mas provavelmente passará despercebido que chegaram ao clube numa época especial do ano.
O primeiro foi Pinga. Estreou-se a 25 de Dezembro de 1930, dia em que, vindo do Funchal, aterrou na cidade do Porto, aqui se estabelecendo para todo o sempre. Foi, dizem ainda hoje os mais velhos, o melhor de sempre! Nem todos concordarão, até porque, no Natal de 1973, foi anunciada a chegada de Cubillas, que rivalizava com Pelé pelo título de melhor jogador sul-americano. Os portistas (e os adversários) comprovariam estar perante um talento único, que viria a transformar-se numa lenda do futebol mundial.
Uma dúzia de anos depois, no Natal de 1985, apresentou-se nas Antas o polaco Josef Mlynarczyk, referenciado como o guarda-redes capaz de dar dimensão internacional à baliza do FC Porto. E como deu... Foi campeão europeu e intercontinental e ainda venceu a Supertaça Europeia. Títulos que Drulovic, “prenda” do Natal de 1993, não conseguiu, mas, em contrapartida, assinou, com uma genialidade única, alguns dos melhores momentos da conquista do pentacampeonato, entre 1994 e 1999. Já McCarthy, chegado no Natal de 2001 para curta estadia e regressando em 2003, ajudou os adeptos a reviver os títulos internacionais, juntando a Taça Intercontinental à Liga dos Campeões. Há “prendas” que nunca se esquecem!
O primeiro fenómeno da Madeira
Esta coisa de oferecer prendas de Natal aos adeptos começou cedo no FC Porto, ainda nos primórdios das competições nacionais do futebol português. A primeira foi colocada no sapatinho no dia 25 de Dezembro de 1930: chamava-se Artur de Sousa, então já conhecido por Pinga. Rezam as crónicas que, vindo da Madeira, aterrou nessa quinta-feira de manhã no Aeroporto de Pedras Rubras e, à tarde, estreou-se com a camisola do FC Porto num particular natalício frente ao Salgueiros.
A estreia oficial haveria de tardar quase um ano, por força dos esforços da Associação de Futebol do Funchal para manter o craque no Marítimo contra a sua vontade, apelando à lei, que daria razão ao FC Porto. Pinga fez-se portista, derramou talento pelo país e pelo estrangeiro e alimentou o ego dos adeptos durante 15 temporadas consecutivas. Juntando as competições regionais às nacionais, efetuou mais de três centenas de jogos pelo FC Porto e marcou mais de 300 golos.
Estrela do universo
Quando surgiram os primeiros rumores de que o FC Porto estaria a negociar a contratação de Cubillas, foi fácil o desmentido, porque nem o mais crédulo dos adeptos sonhava sequer com a possibilidade de contratação de um jogador que brilhava entre a elite. Era prenda inacessível. Em 1972, fora considerado o melhor jogador sul-americano, relegando para segundo plano o “rei” Pelé.
Apesar da informação não estar acessível como nos dias de hoje, não havia quem, sendo adepto de futebol, não (re)conhecesse o talento do peruano Teófilo Cubillas, aparentemente demasiado para a dimensão do futebol português. Engano. No dia 10 de Janeiro de 1974, o craque chegou ao Porto para, durante três anos, maravilhar todos quanto gostavam de futebol, pela forma inigualável como tratava a bola, pelos espaços que inventava para assistir os companheiros, pelos muitos golos que assinou (muitos deles, obras de autor), apesar de não ser um avançado.
Guardião de talentos
A permanente atenção dos observadores do FC Porto descobriu no Bastia um guarda-redes com vontade de mudar de ares, se calhar acessível aos cofres do clube. Junte-se o facto de se tratar de um titular da seleção polaca e Artur Jorge procurar alguém capaz de discutir o lugar com Zé Beto. Assim chegou Josef Mlynarczyk (na foto) ao FC Porto, um dia depois do Natal de 1985. Prenda discreta, pensou-se no momento; escolha acertada, revelou-se no futuro. O polaco impôs não só a grandeza do seu tamanho como a dimensão do seu talento. Em 1987, foi guardião da final de Viena, intransponível nos dois confrontos da Supertaça Europeia e gigante na batalha gelada de Tóquio.
Artur Jorge, o técnico que se atreveu a ganhar pela primeira vez uma final europeia para o FC Porto, costumava dizer que as grandes equipas se constroem de trás para a frente. Pois bem, foi a partir de Mlynarczyk que começou a desenhar a grande equipa que vergou, à força de muito querer e imenso talento, o Bayern de Munique em 1987.
A esquerda do Penta
A guerra dos Balcãs trouxe, em 1992, um Drulovic praticamente anónimo para o futebol português, via Gil Vicente. Na realidade, tinha pouco de anónimo. Fora a guerra que criara os condicionalismos certos para que aceitasse (agradecido) o convite de Barcelos. Não beliscara, contudo, o talento que o então jugoslavo mostrara no seu país, despertando o interesse de um FC Porto em fase de mudança. As coisas não corriam de feição a Tomislav Ivic, que recebeu Drulovic com um enorme abraço cinco dias antes do Natal.
A empatia entre o jogador e os adeptos foi quase imediata. Já com Bobby Robson no comando, pode dizer-se que foi no pé esquerdo do sérvio que começou o assalto ao “Penta”, em 1994/95. Qual telecomando, guiava a bola desde a saída até ao local de destino. Fosse a baliza, fosse um companheiro de equipa. E quando este companheiro era Jardel, então o golo tornava-se algo tão natural que o brasileiro até conquistou a Bota de Ouro. Não foi por acaso que o FC Porto deu ao campeonato o melhor marcador em seis das oito temporadas em que Drulovic jogou nas Antas...
Herói de várias causas
Quando, em Dezembro de 2001, se apresentou nas Antas exibindo a camisola n.º 77 do FC Porto, explicando tratar-se de uma homenagem aos 7-0 com que o Celta de Vigo, dois anos antes, vencera o Benfica - jogo em que participou -, Benni McCarthy entusiasmou os adeptos.
O resto da época até foi complicado para o FC Porto, mas haveria de trazer para as Antas o técnico José Mourinho, a procurar compor uma equipa em que, apesar de tudo, McCarthy deixaria saudades. Tantas que, dois anos depois, em 2003, haveria de voltar, para fazer parte do fantástico grupo que, depois de conquistar a Taça UEFA, receberia o sul-africano para dar uma ajuda decisiva na conquista da Liga dos Campeões e, a seguir, na Taça Intercontinental. Para além de dois Campeonatos Nacionais, uma Taça de Portugal, duas Supertaças. E nessa época fantástica de 2003/04 ainda seria o melhor marcador da Liga portuguesa.
Prenda de Lucho antes de Quaresma
Não estão no Hall of Fame (pelo menos, por enquanto), mas Lucho González e Ricardo Quaresma são também duas referências incontornáveis quando se fala de prendas de Natal para os adeptos. A questão ganha maior relevância porque, num e noutro caso, não se tratou apenas de contratações: protagonizaram regressos desejados, após uma primeira passagem de sucesso pelo clube.
Lucho, El Comandante, voltou em Janeiro de 2012, a tempo de dar um contributo decisivo para a conquista de mais um campeonato, ele que fizera o pleno, entre 2005 e 2008, vencendo as quatro Ligas. Entretanto, voltou a sair, no Inverno passado, quando tinha acabado de chegar outra “prenda” especial: Quaresma. Também ele ganhara muito entre 2004 e 2008, inclusive uma Taça Intercontinental e três campeonatos, desenvolvendo uma relação indestrutível com os adeptos, que o adotaram, fazendo dele um homem da casa.
Texto publicado na rubrica “Os Imortais” da edição de dezembro de 2014 da “Dragões”, a revista oficial do FC Porto que pode subscrever aqui.» in http://www.fcporto.pt/pt/noticias/Pages/craques_no_sapatinho_revista_dragoes_dezembro_2014.aspx