"‘Meus amigos, que desgraça
nascer em Portugal.’
Boi da paciência, que
sempre reencontro,
amo-te e detesto-te até ao
vómito.
Quisesse afagar-te os vis
corninhos,
e ririas melífluo, como
quem padece coceguinhas.
Conheço-te bem demais,
engenhoso atávico ruminante.
Conheço e reconheço ‘teu
minucioso e porco ritual’.
E ainda aí estás, a ti
igual: Anos 0, anos 60.
Marras agora, como já
antes marravas,
no tempo em que te toparam
O’Neill e Ramos Rosa.
Pronto resmungas,
desmaias, fazes que desfaleces;
como em derriço; como se
te sorrisse um incisivo.
Deixa-me que te diga: Com
os 60, que conto, na passagem,
já não estou pra ti
virado.
Mas, se é esse teu melhor
gozo, envolve-me de blandícias,
revolvendo-me p’lo
bandulho.
Estou farto.
Desafias-me a que nem a relance
te suspeite.
Tal nojo me mete a tua
baba.
Tais emboscadas tramas a
poético transporte, meu tesouro.
Cerre os dentes firme,
Cego A Alta Luz.
A que aspiras, mansarrão?
Abre os olhos e vê:
Esses não são já os
melhores dias.
Ateimas ’inda?
Continuas, boi boizinho?
Pertinaz aderente,
sei que só sumirás quando,
por minha vez, me der o fora.
Espera sentado,
que vou ali, e já morro."
Ângelo Ochôa - "Boi da Paciência"
Ângelo Ochôa - "Boi da Paciência", escrito in Caleidoscópio.