"FELIZ MENTIRA
O que há de mais ingrato neste mundo,
Não é o incerto! O que mais nos desilude
É o sentir à primeira vista devir moribundo,
Ainda que tudo o que se faça nada mude.
Quando a paixão se faz num rosto,
Precipitada por um amor de pedra,
Há venturas que lavam em desgosto,
As calçadas de chão onde não medra.
E ao passar, o que mais embaraça,
É ter sido despojado desta crença,
Por alguém que tanto a amordaça,
E ao olhar devolve em indiferença.
A vida é feita de promessas ocas,
Montagem de amor, feliz mentira!
Tudo se esvai em vício de bocas,
E se uma em prazer dá, a outra tira.
Jamais que um peito abra à ilusão,
As portas do querer que não perdura,
Não há perdão no ato de contrição,
De quem declarado ser tanta jura.
Um dia longe, tocado pela lembrança,
Ao acreditar aquele viver de verdade,
O coração, de tanto ansiar se cansa,
Em bater por mais um dia de saudade."
Eugénio Mourão
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